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Artigo

As raízes das árvores são ninhos das nossas memórias

 

parque nacional da floresta da tijuca

Para muitas comunidades indígenas e tradicionais, as árvores e suas raízes são veneradas como símbolos de sabedoria e continuidade

Ensaio de Rosângela Trajano

As raízes das árvores, com sua imersão no solo e seu entrelaçamento com o ambiente, desempenham um papel profundo e simbólico que transcende sua função biológica de nutrir e estabilizar a planta.

Elas são, em um sentido mais amplo, os pilares de uma conexão ancestral entre a natureza e os seres humanos. Estas raízes, que se estendem e se entrelaçam pelo solo, podem ser vistas como guardiãs de memórias seculares — como se fossem os fios invisíveis que ligam o ado ao presente.

E, ao mesmo tempo, as raízes representam os laços emocionais profundos entre as gerações mais velhas e a terra, como se abraçassem a árvore como uma criança, cuidando-a e protegendo-a.

A ideia de que as raízes “guardam memórias” sugere que, de alguma forma, as árvores não apenas reagem ao ambiente em termos de crescimento e desenvolvimento, mas também preservam as experiências e os ecos dos tempos ados.

Essa noção pode ser entendida de várias maneiras. As árvores, com sua longevidade, se tornam testemunhas do tempo — elas assistem, silenciosas e constantes, às transformações do mundo ao seu redor, absorvendo as vibrações da terra, da chuva e do vento. As raízes, como parte fundamental da árvore, tornam-se os receptores dessas mudanças, guardando essas memórias da mesma forma que os antigos contadores de histórias preservam a sabedoria ancestral através das gerações.

Dessa maneira, as árvores não são apenas seres biológicos, mas entidades capazes de comunicar a sabedoria do tempo, conectando o ado, o presente e o futuro.

Para muitas culturas ao redor do mundo, as árvores têm um significado profundo. Elas são vistas como conectores entre os mundos visível e invisível, entre os vivos e os mortos.

As raízes, em especial, são as partes mais conectadas à terra — simbolizando a conexão direta com os ancestrais e com as forças que moldam o destino. Para muitas comunidades indígenas e tradicionais, as árvores e suas raízes são veneradas como símbolos de sabedoria e continuidade.

Quando um mais velho em uma comunidade fala sobre a árvore, é como se ele estivesse compartilhando não apenas o conhecimento da natureza, mas também as memórias coletivas dos ancestrais.

Ao cuidar das árvores, eles sentem que estão cuidando de algo mais do que uma planta; estão cuidando de um elo espiritual, de um pedaço da história que ressurge nas folhas, nas raízes e no vento.

Em uma dimensão emocional, o cuidado das raízes pelas gerações mais velhas, muitas vezes comparado ao abraço de uma criança, revela um sentimento profundo de proteção e carinho.

As raízes podem ser vistas como a base de toda a árvore — não apenas como um ponto de sustento físico, mas também como a base emocional da continuidade da vida.

Quando as gerações mais velhas interagem com as árvores, como ao plantar, cuidar ou apenas observar suas raízes, elas muitas vezes experimentam uma sensação de ligação com o que é eterno.

O toque das mãos enrugadas na casca de uma árvore, ou o olhar atento para a complexidade das raízes se espalhando sob o solo, evoca a percepção de um ciclo sem fim, onde o ser humano e a natureza se encontram em um laço eterno de cuidado mútuo.

Este vínculo com a terra e com as árvores revela uma verdade fundamental sobre o ser humano: nossa própria identidade está profundamente entrelaçada com o ambiente natural que nos cerca.

As raízes não são apenas biológicas, mas simbólicas — elas representam os laços que temos com nossa própria história, com as gerações adas e com a memória coletiva de nossas culturas.

Quando uma pessoa mais velha observa uma árvore, ela não está apenas vendo um ser vivo; ela está testemunhando um reflexo da própria existência, uma entidade que compartilha as mesmas lutas, os mesmos ciclos e as mesmas transformações do ser humano.

Portanto, o cuidado com as raízes das árvores é, em muitos aspectos, um cuidado com as raízes da humanidade. É um gesto de carinho e respeito não apenas pelas árvores, mas também pela história que elas guardam e pela memória que preservam.

Ao cuidar de uma árvore, os mais velhos não estão apenas protegendo uma planta, mas estão, em certo sentido, cuidando de um símbolo da continuidade da vida — um elo profundo entre o ado, o presente e o futuro.

Assim, as raízes das árvores não são apenas o fundamento físico do ser vegetal; elas são o alicerce de um vínculo emocional e espiritual que nos conecta a tudo o que já foi e tudo o que ainda está por vir.

Rosângela Trajano, Colunista do EcoDebate, é poetisa, escritora, ilustradora, revisora, diagramadora, programadora de computadores e fotógrafa. Licenciada e bacharel em filosofia pela UFRN e mestra em literatura comparada também pela UFRN. É pesquisadora do CIMEEP – Centro Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos. Com mais de 50 (cinquenta) livros publicados para crianças, ministra aulas de Filosofia para crianças na varanda da sua casa, de forma voluntária. Além disso, mora pertinho de um mangue aonde vai todas as manhãs receber inspiração para poetizar.

 
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
 

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